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Isso não é um cachimbo por André Cruz




Há uma expressão no meio artístico que diz que quando uma arte é criada e lançada ao mundo, sua autoria e seu verdadeiro sentido se perdem, estando sujeita a livre interpretação. A linguagem é a tentativa de unificar o sentido das representações de forma que seja compreendida por um grupo, através de signos (sinais), como as letras que nos permitem a comunicação. Mesmo pessoas que não são alfabetizadas compreendem slogans e logotipos de marcas famosas, pois elas atribuíram uma representação imagética, em termos de Gestalt, ou seja, o sujeito reconhece a "forma" da palavra.




É próprio da arte nos trazer mensagens profundas e abstratas. Por mais que já exista um conceito de "arte abstrata", podemos dizer que toda arte é abstrata de alguma forma, por isso a dúvida "a vida imita a arte ou a arte imita a vida?". Analisar a arte é o momento em que damos vazão às nossas fantasias, e uma obra que brinca muito com isso é "La Trahison des Images" ou "A traição das imagens" de René Magritte.


Nessa obra, Magritte nos proporciona a oportunidade (ou ousadia) de compreender o ser e a representação do ser. Podemos percorrer o caminho de Heidegger a Lacan (como se não bastasse complicar apenas com Lacan, nós também complicamos com Heidegger). Heidegger separa o "ser" do "ente" e Lacan separa o "significado" do "significante". O "ser" mencionado por Heidegger diz respeito ao objeto existente em sua forma física, enquanto o "ente" se refere à sua essência e utilidade. Fazendo um paralelo com a obra, não é possível fumar o cachimbo pintado por Magritte, uma vez que ele retrata apenas a forma desenhada do cachimbo e não o próprio objeto. Por outro lado, a frase "ceci n'est pas une pipe" ou "Isso não é um cachimbo", presente na obra, apesar de ser um aviso, faz parte da obra, criando assim uma simbiose simbólica e significativa com o desenho do cachimbo. Assim, chegamos a Foucault, que escreveu um livro específico sobre essa obra, nos levando a questionar o verdadeiro significado da frase. A frase nega que a própria frase seja um cachimbo? A frase nega que o desenho do cachimbo é um cachimbo? A frase nega que o conjunto completo com a frase e o desenho é um cachimbo? Por que ela precisa destacar uma negação em relação a uma representação de ideia platônica sobre aquele cachimbo (se é que podemos chamá-lo de cachimbo)? Afinal, O QUÊ é um cachimbo? Eu poderia destacar o verbo nesta pergunta, como "O que É um cachimbo", pois assim estaria questionando sobre a essência do cachimbo em si, sobre o que o torna um cachimbo e não outra coisa, mas destaquei o "QUÊ". E embrelação a esse "quê" na pergunta, seria um "quê" como pronome interrogativo (afinal, trata-se de uma interrogação questionando algo indefinido) ou seria um "quê" como substantivo (uma vez que a ideia seja dissecar a essência do cachimbo questionando até mesmo a sua nomenclatura como símbolo)?


Através de Lacan, é possível compreender isso e separar esses pontos quando se conhece um cachimbo, quando o sujeito já foi apresentado a um cachimbo. Assim, o significante passa a ser a interpretação que o sujeito tem e o significado, a representação do objeto.


O significante pode variar de um sujeito para outro, mesmo o objeto tendo o mesmo significado. Isso ocorre porque as interpretações são pessoais e constantes. Por fim, é pertinente a pergunta: "A arte tem algo a dizer sobre nós ou nós temos algo a dizer sobre a arte?"



André Cruz

Ψ Psicanalista 🎧 Produtor musical 📖 Escritor/Compositor



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